sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Autora lança livro de forma independente contado sua história no Caminho de Santiago

“Espero que Campos de Vento possa inspirar a sua caminhada”. Noite abafada de quinta-feira (15/10) em São Paulo, primavera com cara de verão, dirijo-me esbaforido para a Livraria Cultura, no Conjunto Nacional, na Avenida Paulista. A pressa em chegar tinha um importante motivo, havia combinado uma entrevista – aliás, a primeira presencial deste blog – e não poderia chegar atrasado. Após pegar um ônibus mais lerdo que uma tartaruga e fazer uma caminhada de quase um quilômetro pela Avenida Paulista, chego ao local marcado e encontro a autora do livro “Campos de Vento”. A produtora de eventos e palestrante Andrea Colen agora se aventura como autora, de forma totalmente independente. A sua primeira excursão pelo campo das letras é o relato da sua inédita experiência pelo Caminho de Santiago de Compostela, em viagem realizada no ano 2011. Depois do encontro na livraria, dirigimo-nos até um café, local mais agradável para conversar. Andrea se coloca na minha frente e se mostra bem receptiva; não nos conhecemos, mas de forma bem humorada logo ela toca a falar sobre o livro e os perrengues que uma escritora independente passa. Pergunto se ela teve ajuda de alguém na empreitada, ela me responde: “Eu e o marido”. Para a primeira edição, foram impressos 1.000 livros e a autora conta orgulhosa que já foram vendidos 425 exemplares “tenho até o natal para vender os mil”, conta ela rindo e de, forma otimista, já visualiza uma segunda edição. Nascida no Rio de Janeiro e atualmente moradora de Santana de Parnaíba-SP, Andrea lançou seu livro oficialmente na 2ª feira literária da cidade de Rio Novo, em Minas Gerais. O evento contou com a presença do cartunista Ziraldo. A autora me explica de forma triste como o mercado literário funciona e, infelizmente, não é tão bonito quanto parece. Do valor do livro, 50% dele ficam com a editora e os outros 50% que corresponderiam para o autor 75% ficam com a gráfica e 25% ficam com a autora. “Poxa, eu levei dois anos e meio para escrever o livro, fiz a viagem, e fico com a menor parte”, fala ela indignada.
A travessia Quando começamos a falar sobre o Caminho ela me contou que o desejo de fazer a travessia apareceu em maio de 2007, e a previsão era fazê-lo em 2008 com a ex-sogra Dona Anninha – que já havia feito a viagem. Mesmo após a separação de Andrea com o filho dela, as duas mantiveram a amizade. Andrea sente falta da grande companheira que, por fatalidade do destino, faleceu dois meses depois de combinarem a viagem e –emocionada – disse que a amiga a chamava pelo apelido carinhoso de “moleca”: “Moleca se você fosse minha filha não seria tão parecida comigo”, mas Dona Anninha por certo esteve presente na viagem. A mochila que se vê na ilustração da capa do livro pertencia à amiga e foi usada por Andrea Colen durante a caminhada. O caminho foi transformador para Andrea. Foi onde ela diminuiu o ritmo da vida profissional e buscou novos horizontes. “Não é que eu fiz o caminho e cheguei aqui outra pessoa, as fichas foram caindo aos poucos, levei bem uns seis meses para me adaptar”. Para se ter uma ideia, o Caminho de Santiago de Compostela tem 800 quilômetros e foram 33 dias de caminhada. O livro narra a primeira experiência pelo caminho e, semelhante à americana Cheryl Strayed, autora do livro “Livre”, Andrea também passou por várias situações desagradáveis antes e durante a travessia, mas comentou entre risadas que “aquela mulher era muito mais doida que eu”. O que as assemelha a duas aventureiras são os erros cometidos para compra dos equipamentos. No caso de Andrea, ela comprou uma bota de inverno para fazer a trilha. “Eu fiz o caminho no início do outono e o vendedor me vendeu botas de inverno”. O desconforto foi terrível não apenas nos pés, mas também nos locais de acomodação para passar a noite, “você encontra de tudo nas paradas”. Mas as experiências ruins vividas pela autora agora servem de base para as suas palestras e motiva as pessoas a conhecerem o local. Inspirada por Paulo Coelho, ela diz que o caminho hoje deve muito ao autor brasileiro. “Conheci duas chinesas que fizeram o caminho por causa do livro e, dentro da Espanha, dentro do caminho, ninguém pode negar a referência que Paulo Coelho se tornou”, explica Andrea.
Escrever ou não escrever? A autora contou que tomou gosto pela literatura por volta dos trinta anos de idade, entre os seus autores prediletos estão: Gabriel Garcia Marquez, Cora Coralina e Cecília Meireles. Mas, esses autores não influenciaram a sua inscrita. Ela não tinha ideia se iria colocar a experiência no papel, quando fez a travessia. Ela fez algumas anotações e gravações durante a viagem, mas sem pretensões literárias, foi após um comentário com uma amiga pedagoga que a ideia foi tomando corpo. Foram dois anos e meio do processo de escrita à elaboração do livro. As fotos reproduzidas no livro são todas dela, tiradas de seu aparelho celular. O livro que teve inicialmente uma edição digital em espanhol foi lançado nas cidades de Leon, Torri Vierra, Malagna, Madri e Barcelona durante a segunda vez que Andrea percorreu o caminho, em 2014. “Veja como são as coisas: depois do lançamento em digital, hoje elas me pedem uma versão em papel”, brinca a autora sobre o desejo das pessoas em meio ao mundo digital. A capa é do amigo Flavio Vitoi, o prólogo é de Santiago Jordán Minetti Andrés e a orelha da capa é de Marlene Damico Lamarco, e um gostinho ainda mais especial, a primeira poesia publicada de sua mãe está no livro. A autora que não tinha pretensões em literatura, agora já pensa no próximo livro que será de contos. O que ela espera do livro: que ele seja fonte de inspiração para as pessoas não apenas em fazer o Caminho, mas que a leitura as leve a refletir sobre a vida. Os interessados em conhecer um pouco mais sobre a autora e o livro podem fazê-lo pela página no Facebook:">https://www.facebook.com/camposdevento?fref=ts">. A independência literária tem seu lado compensador. A autora tem uma interação maior com os seus leitores: “Eu faço algumas entregas do meu livro e algo que poderia levar de 10 a 15 minutos leva uma hora e meia, as pessoas querem conversar”, diz ela feliz com a proximidade e essa troca de ideias que a atividade está lhe proporcionando.
A primeira entrevista Após as duas horas de conversa sai do café, com uma amizade, feliz e, ao mesmo tempo, preocupado. Estava com duas histórias nas “mãos”: uma eu posso levar para onde eu quiser, que é o livro, que em breve espero providenciar uma resenha, e a outra gravada e rascunhada que era história de vida daquela mulher cativante que irradia alegria e bom humor, mesmo tendo vivido e ainda vivendo algumas dificuldades. Andrea enfrentou tropeços para realizar seu sonho de ser autora independente e deseja virar um case de sucesso. Ela não se lembrou de ninguém para escrever o seu livro, agora eu me lembrei da minha professora da pós-graduação, Monica Martinez – por coincidência era dia dos professores. “Essa é uma ótima história de jornada do herói para relatar”, ela diria. Bom, espero que a autora e a minha professora tenham me inspirado, mesmo antes da leitura do livro a contar um pouco desta incrível jornada.

Um comentário:

  1. Parabéns, Ricardo! Gostei muito da entrevista. Ela mostra bem como é o mercado literário é injusto com o autor.

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